"Todos estão contrariados
com ela porque há tanta corrupção que nem ela pode fazer nada".
Uma das grandes
contradições do nosso Brasil é a seguinte: a maioria da população rejeita a
corrupção, mas também rejeita a presidente que rejeita a corrupção.
Falta a compreensão que o
cineasta Joel Cohen (um dos irmãos Cohen), autor da frase acima, em matéria de
Rodrigo Salem hoje na "Folha de S. Paulo" demonstrou ter a respeito
da presidente Dilma.
A lucidez de Cohen talvez
tenha a ver com seu relativo distanciamento do dia a dia do país (que costuma
visitar), o que o preservou, portanto, da lavagem cerebral que os brasileiros
recebem diuturnamente através da mídia, que insufla a deposição da presidente e
mistura joio com trigo, sem o menor escrúpulo, mas com muito método.
Se o ambiente não
estivesse tão enevoado como está, saturado de contrainformações, conturbado por
noticiário sinistro, que mais confunde do que explica, impedindo a visão mais
clara e sensata dos acontecimentos, os brasileiros poderiam ter percebido a
seguinte coisa estranha: a pessoa que mais ardentemente deseja e age pela queda
da presidente é uma das mais acusadas de atos de corrupção e as acusações são
as mais robustas possíveis, para dizer o mínimo, suficientes para provocarem
haraquiri em outras sociedades mundo afora.
Não é possível admitir por
um segundo sequer que tal pessoa, que ocupa um dos postos de maior poder no
país, queira derrubar a presidente para acabar com a corrupção. Por que, então,
o sr. Eduardo Cunha se empenha dia e noite em destruir o governo? Não seria o
caso de imaginar que ele quer Dilma fora porque ela é a pedra no sapato dele e
dos seus aliados que têm problemas semelhantes aos seus, se bem que em muito
menor grau?
Será apenas mera
coincidência o movimento do impeachment ter sido deflagrado quando a Lava Jato
começou a fazer estragos no mundo político de Brasília?
Combater a corrupção
instalada nos governos brasileiros, provavelmente desde a chegada de Dom João
VI e sua corte ao Brasil, não é fácil. Ter vontade política não é o bastante.
Não se acaba com ela com uma ordem. Com um decreto. Com um passe de mágica. E não
é tarefa isenta de perigos. Não o perigo de perder em votações do Congresso,
apenas, mas a própria vida.
O mais claro sinal de que
ela não tem nada a esconder e está disposta a tirar da toca os ratos que
trabalham nos porões para afundar o navio é permitir investigação profunda do
seu próprio governo.
Ela teria, é óbvio,
instrumentos para brecar a Lava Jato, mas não os utiliza e faz questão de
manter um ministro da Justiça que pensa como ela, contra tudo e contra todos.
Dilma é aliada dos que
combatem a corrupção, e não inimiga. Só falta aos que combatem a corrupção
perceber.
Querem derrubar Dilma não
por ser corrupta. Mas por não ser.
Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão", "O domador de sonhos" e "Dragonfly" (lançamento setembro 2016).
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